COMO ÁGUA NA ÁGUA
Isabel Cordovil
17.09.20 - 18.10.20
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Momento inicial do projecto Alcazar, projecto editorial colectivo organizado pelo EGEU e que junta artistas literários, plásticos e visuais, Como água na água, de Isabel Cordovil, abre um caminho a partir das ideias de mito e de ruína, explorando a intenção de documentar um espaço inexistente.
Procurando modalidades de ocupação como a solubilidade, a liquidificação e as tensões adjacentes a um processo documental sem cenário original, a exposição individual de Isabel Cordovil terá simultaneamente uma função de abertura e de fechamento dentro deAlcazar: abertura no sentido em que funcionará como referência, possibilitando uma exploração posterior; fechamento no sentido em que irá delimitando o espaço, tornando-o mais tangível.
É, contudo, enganador pensar nesse confronto como uma forma de oposição. Pelo contrário, é justamente por culpa dessa tensão entre abertura e fechamento que se contempla uma possibilidade transversal à referência e à sombra. Há um mundo a inaugurar-se a cada dobra de saliva. Que é também maresia. Ou rio, pedra. Como há também um mundo a fechar-se no nó de cada palavra. Por um lado, sim, há na ausência o molde de um corpo ido, o sublinhar de um tempo irrecuperável (os lençóis de uma manhã sozinha, por exemplo). Mas não é também isso o início do traço de uma nova silhueta, delineada nos limites das marcas de suor, mesmo que invisível?
O exercício é extensível. Ver. Olho o olho ou olho o olho que olha? E de outra forma, mais longe: há em cada novo hino a pretensão definitiva de uma história poética em epílogo, uma epístola repetível? Ou mais perto: um copo entre distâncias, com o gelo a derreter num bar em nuvem, uma despedida. Ou de outra forma, quando o primeiro toque como febre de uma mão venenosíssima. Guardar o vento ou tocar a pedra?
“And I’ve dreamt of your desiring, so sure, so rooted - magnificent. We don’t have too much time.”(1) Que raíz? “Second skins to be in second worlds that are just as home-like and wholesome” . Em tudo (2) isto há água. E talvez a ideia de uma idealização a partir de um ponto de vista póstumo seja simples: juntar o som, a curva, o fosso, a flor e a mentira - todos os cantos da chuva. Primeiro, ser a pele que cada um deixa em pó nos passeios. Depois, ser o cheiro que a água do mesmo suor levanta quando cai sobre as ruas depois de feita nuvem. Petrichor. Tempo, claro. Como água na água.
A. Lenz
(1) To Hold Fire Still: 15-16. Isabel Cordovil, 2019
(2) ibid.: 39.